Não é raro que equipes inteiras de empresas às vezes só trabalhem para “apagar incêndios” ou gerenciar problemas cotidianos, em vez de ter tempo pré-determinado pela liderança para refletir sobre novas ou melhores soluções. Se todo mundo é bombeiro na sua organização, não adianta dizer que há espaço para a criatividade das pessoas fluir.    

Débitos técnicos, incidentes e sistemas que funcionam mal também acabam comprometendo a habilidade de um time ou de indivíduos serem criativos. Em geral, os sistemas da companhia precisam rodar sem incidentes e complicações frequentes, para que as pessoas disponibilizem mais do seu tempo para pensar além de problemas. Além de ser tecnicamente confuso, trabalhar constantemente só com problemas acaba gerando frustração e burnout nos funcionários.   

É comum startups trabalharem virando dias e noites, porque a equipe é pequena e está todo mundo correndo para produzir primeiras versões de produtos e serviços. Mas isso não quer dizer que esse modo de operar deva se perpetuar como o modelo de trabalho na organização uma vez que ela cresça.

De modo geral, a menos que haja algum incidente técnico de prioridade alta, tudo o que se faz hoje deveria poder ficar para amanhã. Emergências têm que ser encaradas como esporádicas, não como o trabalho do dia a dia, e cabe à liderança disseminar esse tipo de cultura.

A menos que haja algum incidente técnico de prioridade alta, tudo o que se faz hoje deveria poder ficar para amanhã. 

Propensão ou aversão ao risco

Em engenharia (e em outras áreas também) sempre se aprende com os erros, porque existe uma investigação posterior sobre o que deu errado e um ajuste futuro de aplicações. Por exemplo, talvez o que não dá certo para o projeto A possa dar certo se for aplicado no projeto B ou no C, e não se perderá mais tempo com linhas de tentativas que se provaram falhas.

É evidente que todos querem acertar mais do que errar, e o nível de ousadia para arriscar varia muito de profissional para profissional, especialmente no que diz respeito à formação acadêmica de cada um. Pessoas com uma formação acadêmica rigorosa no método científico têm mais familiaridade com o conceito de que é parte do processo científico propor uma hipótese e testá-la para se chegar a uma conclusão e de que vários dos testes darão errado.

Nos últimos anos, essa mentalidade mais científica vem sendo incorporada à cultura das empresas de tecnologia, e as pessoas estão ficando cada vez mais confortáveis com o processo de experimentação, validação e recolhimento de dados em pequena escala para testar novas ideias e produtos.

Filosofias de trabalho ágeis de como criar um MVP e o da metodologia da “Lean Startup”, descrita inicialmente por Eric Ries, valorizam justamente a abordagem de que deve haver uma forma simples e rápida de testar inicialmente uma ideia e de colher dados antes de partir para uma implementação ampla e sem fundamentos para justificá-la.

A Amazon, cuja metodologia de gestão é descrita no livro Obsessão pelo cliente, teve bastante influência no ambiente empresarial brasileiro com o conceito de trabalhar a gestão a partir de dados e métricas específicos, inclusive no que diz respeito a como e por que promover ideias e produtos que impulsionem o negócio à luz de uma necessidade do cliente.

As pessoas estão ficando cada vez mais confortáveis com o processo de experimentação, validação e recolhimento de dados em pequena escala para testar novas ideias e produtos.

Marcus Fontoura
Sobre o autor

Marcus Fontoura

Marcus Fontoura é atualmente technical fellow na Microsoft e CTO do Azure Core. Iniciou a carreira na área de pesquisa da IBM em 2000, depois de concluir o doutorado na PUC-Rio e o pós-doutorado na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos. Teve passagens pelo Yahoo! e pelo Google, e promoveu uma transformação digital na fintech brasileira StoneCo, onde atuou como CTO. É autor do livro Tecnologia Intencional e publisher da plataforma com o mesmo nome.