Faz parte do compromisso profissional do líder de tecnologia aprender com o CEO e com colegas sobre as outras áreas do negócio em que atua, como a jurídica, a de recursos humanos, a tesouraria, e, ao mesmo tempo, instruí-los sobre tecnologia, para que possam definir juntos as métricas que avaliam a atuação do CTO e a área.
Quando um CEO não tem experiência em gerir empresas de tecnologia, parte do trabalho do líder de tecnologia é dar insumos para que ele possa fazer isso da melhor forma possível, esclarecendo:
- O que é produtividade em engenharia
- Conceitos de plataformas e de ferramentas
- Como pensar e organizar o time
- Como dar espaço e estimular a inovação
Por outro lado, é responsabilidade do CTO expandir seus horizontes de conhecimento com o enfoque de pensar como a tecnologia pode se integrar às outras áreas da companhia.
Expectativas e entregas dos líderes de uma companhia
Lideranças administrativas e de tecnologia devem planejar conjuntamente os horizontes de inovação em termos de negócio para a empresa, o que acaba por também mapear os investimentos para a inovação de produto.
Se a estratégia de uma empresa envolve, por exemplo, expansão geográfica, o CTO ajuda a determinar que tecnologia será necessária, e em que horizonte de planejamento, para que o movimento seja factível. Além do pensamento estratégico, há também o acompanhamento do H1, o business as usual, as operações do dia a dia.
A maior dificuldade do relacionamento entre CTOs e CEOs, especialmente quando uma das partes é nova na empresa, costuma ser a de alinhamento de expectativas e entregas. O modo mais direto de resolver isso é através de conversas frequentes e troca de informações para que o CEO se familiarize com os conceitos da tecnologia intencional, a abordagem sistemática de montar o time e de pensar sobre plataformas, sobre ferramentas, sobre colaboração e sobre incidentes, para ficar na mesma sintonia dos líderes de tecnologia.
É sabido que qualquer CEO tem demandas legítimas que vêm de todos os lados e fica, portanto, com a ingrata tarefa de ter que priorizar e equilibrar tudo com recursos limitados. Até a organização mais rica do mundo tem limites financeiros e exige muito mais nãos do que sins de seus líderes.
Nesse contexto, é bem frequente que o líder de tecnologia ouça “não” para um pedido, nem sempre por vontade do CEO, mas por contingências, como um congelamento de vagas devido ao aperto no orçamento.
CTO: líder técnico e emocional
São várias as frustrações que atravessam o caminho do CTO:
- Em épocas mais críticas, projetos mais especulativos podem ser colocados em pausa ou cancelados
- Pode haver mudanças de regulamentação
- Podem surgir problemas inesperados com fornecedores e terceirizados
Mais do que lidar com sua própria frustração, o líder de tecnologia tem como encargo gerir a ansiedade do time e manter o moral e a motivação, principalmente quando projetos são cancelados ou perspectivas de promoção são adiadas.
Ao tomar decisões mais extremas, como a unificação ou a eliminação de certos projetos, o ideal é que a liderança produza algum tipo de documento descrevendo as diretrizes para a tomada daquele rumo. É recomendável que o processo seja inclusivo no sentido de que as pessoas envolvidas sejam ouvidas, e que o veredicto venha sem muita demora.
Não há como fugir: líderes sêniores têm sempre que lidar com escolhas difíceis, que deixam um rastro de discordância.
O melhor remédio é a cultura do “disagree and commit” ou “discordo mas aceito”, para que todos possam seguir em frente. Não dá para querer agradar a todo mundo, e ficar protelando deliberações pode trazer ainda mais incertezas e prejuízos.
A melhor maneira de agir com justiça nesses momentos é basear a escolha em um julgamento técnico bem fundamentado, seja em prol de uma plataforma ou de uma ferramenta, seja uma configuração de time ou um direcionamento estratégico para um projeto de curto prazo ou médio prazo, seja apoiar ou não uma inovação. São essas decisões custosas do ponto de vista financeiro e de pessoal que mais requerem liderança firme – com a expectativa de que os líderes estejam certos na maior parte das vezes.
É imprescindível, nesse aspecto, que o líder de tecnologia esteja tecnicamente atualizado. Isso obviamente vale para qualquer área, não só para a engenharia. Se um profissional não programa há dez anos, não pode tomar uma decisão sobre ferramentas, inteligência artificial e plataformas baseado nos parâmetros que tinha uma década atrás.
Hoje em dia, por exemplo, existem muitas opções para desenvolvimento de front end multiplataforma, gerenciamento de contêineres e ferramentas de observabilidade. Essas áreas estão em constante evolução e os líderes de engenharia precisam acompanhá-las para que possam tomar decisões com assertividade.

Marcus Fontoura
Marcus Fontoura é atualmente technical fellow na Microsoft e CTO do Azure Core. Iniciou a carreira na área de pesquisa da IBM em 2000, depois de concluir o doutorado na PUC-Rio e o pós-doutorado na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos. Teve passagens pelo Yahoo! e pelo Google, e promoveu uma transformação digital na fintech brasileira StoneCo, onde atuou como CTO. É autor do livro Tecnologia Intencional e publisher da plataforma com o mesmo nome.